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Re:Medidas e Metas para a Educação - 17/06/06 21:06 Temos a tentação, a que o próprio governo está longe de ser imune, de tentar resolver os problemas da educação com medidas avulsas. Compreende-se : também os problemas são avulsos, e são de tal maneira numerosos que a própria ideia de os ordenar por prioridades nos deixa com a sensação que estamos a ignorar coisas que não podem ser ignoradas.

E contudo há duas medidas sem as quais tudo o que se fizer em educação, por mais revolucionário ou corajoso que pareça e por mais votos que renda ao partido do governo, será mero paliativo lampedusiano.

Para inverter os efeitos da filosofia da educação delirante que está na base das nossas políticas educativas*, e para trazer de novo as escolas às funções que lhes competem, é preciso antes de mais nada criar, ou permitir que se crie, uma Ordem dos Professores; e em segundo lugar extinguir o Ministério da Educação, distribuindo as suas competências, segundo o princípio da subsidiariedade, por autoridades educativas regionais e locais** e pelas próprias escolas.

A ideia duma Ordem dos Professores assusta muita gente. Assusta em primeiro lugar o Estado, que não quer enfrentar a concorrência de mais uma «corporação». Assusta os sindicatos, que não querem uma estrutura representativa de professores que desloque a actividade reivindicativa do campo estritamente laboral para o campo da cidadania e da utilidade pública. Assusta umaa esquerda, que vê nela uma manifestação de elitismo. E assusta uma certa direita, que não reconhece direito de cidade a qualquer parcela da sociedade civil que não sejam as empresas.

Conviria reconhecer, no entanto, que as corporações, quando expulsas pela porta, voltam a entrar pela janela. Não é por não haver uma Ordem dos Professores que a corporação deixa de existir. Simplesmente, em vez de existir onde faz falta, existe onde é mais nociva: na direcção das escolas e na pesadíssima burocracia do Ministério.

Para que serviria a Ordem? Para certificar, na sequência de provas adequadas e por meio duma carteira profissional, a aptidão dos candidatos à profissão.Para criar um código ético e deontológico para a profissão que vinculasse os professores não só pela obediência, mas pela vontade; para definir, tendo em conta esse código, as tarefas próprias da profissão; para defender os professores contra solicitações ou ordens do poder público ou dos poderes privados que fossem eventualmente incompatíveis com a sua função na sociedade; e para elevar os professores da condição de funcionários à condição muito mais exigente de profissionais

Quanto à extinção do Ministério, é desde logo uma questão do mais elementar bom senso. Quando se sabe que uma percentagem elevadíssima do orçamento da educação vai para pagar vencimentos, é criminoso que tantos desses vencimentos sejam pagos a burocratas que nunca deram uma aula - ou pior, que deram, não gostaram, e procuraram refúgio onde nunca mais tivessem que dar nenhuma.

Ficaria tudo resolvido com estas duas medidas? Nem por sombras. Mas nada ficará resolvido sem elas.

Há, porém, muitas medidas avulsas que poderiam e deveriam ser tomadas, das quais, ressalvando o que escrevi acima, passo a indicar algumas:

1. Responsabilização dos alunos em matéria disciplinar.Os professores e os funcionários deviam ter o poder de punir, sem complicações burocráticas, um aluno que lhes respondesse torto ou que batesse num colega - sem falar em actos mais graves como boicotes à aprendizagem, roubos, extorsões, campanhas de terror, e actos de vandalismo. Se o encarregado de educação do aluno não concordasse com a punição aplicada, poderia recorrer dela: então, e só então, haveria lugar à abertura de processo, investigação formal, recolha de provas, audição de testemunhas, e a todos os outros procedimentos destinados a assegurar os direitos de defesa do aluno.

2.Responsabilização dos encarregados de educação pela assiduidade e comportamento dos seus educandos. As faltas disciplinares deviam ser repostas. Os encarregados de educação deviam perder o direito de justificar faltas. Sempre que um aluno tivesse uma falta de presença injustificada ou uma falta disciplinar (injustificável por natureza) o encarregado de educação devia ter que pagar uma coima. Na Suíça, onde leccionei, essa coima era de 100 CHF no cantão onde vivia - o equivalente a 65€. Dada a diferença nos níveis de vida, acho que 20€ seria uma quantia razoável para Portugal. No caso de não concordar com a coima, o encarregado de educação poderia interpor recurso mediante o depósito em dobro da quantia em causa, recebendo tudo em caso de decisão a seu favor e perdendo tudo em caso de decisão a favor da escola. Se no fim do ano lectivo houvesse coimas por pagar, seria vedada ao aluno a frequência da mesma escola no ano lectivo seguinte.

3.Escolha livre da escola por parte dos encarregados de educação, sujeita porém aos resultados obtidos pelo aluno nos anos anteriores. Não faria sentido que a um aluno mal classificado numa escola de baixo nível de exigência fosse permitido frequentar no ano seguinte uma escola caracterizada por um nível de exigência alto.

4.Substituição das reprovações e das retenções pela mudança de escola: um aluno com más classificações frequentaria o ano seguinte numa escola com um nível de exigência mais baixo, um aluno com classificações altas teria acesso a uma escola mais exigente, e um aluno com classificações médias continuaria no nível em que estava.

5.Fim das disciplinas de banda estreita. A função das escolas generalistas não deve ser o fornecimento de competências profissionais muito específicas, mas sim o fornecimento de competências gerais - domínio da língua materna, articulação do discurso e do pensamento, inglês, matemática, uso de certos instrumentos transversais a quase todas as actividades profissionais, culturais ou lúdicas - como o automóvel e o computador - e bem assim um domínio razoável do método científico de validação do conhecimento.

6.Separação - não necessariamente geográfica - entre as escolas do ensino básico e as do ensino secundário.

7.Impedimento de matrículas no ensino secundário em disciplinas a que o aluno tivesse tido média inferior a 3,5 no terceiro ciclo do ensino básico.

8.Exames de admissão ao ensino secundário, a cargo das respectivas escolas.

9.Formação profissional obrigatória para quem ficasse impedido de frequentar o ensino secundário por força do disposto nos dois números anteriores.

10.Exames nacionais finais em todos os ciclos (desburocratizados, porém, e reduzidos a uma só chamada, uma só época e uma só versão para cada nível de cada disciplina, de modo a não ocupar com exames o tempo que as escolas devem dedicar ao ensino). Destes exames ficariam dispensados os alunos que, tendo concluído a frequência do 3º ciclo, se inscrevessem nos exames de admissão ao ensino secundário, de modo a que não houvesse duplicação de exames.

11.Exames de admissão aos estabelecimentos de ensino superior (a cargo destes).

12.Criação de escolas profissionais em grande número.

13.Férias escolares mais curtas e mais frequentes, calculadas de modo a que o número anual de semanas lectivas crescesse mas a duração dos períodos lectivos diminuisse.

14. Utilização de outros edifícios públicos ou, mediante contrapartida, privados, para a realização de exames e outras tarefas para-escolares que pudessem interferir com o calendário lectivo dos estabelecimentos.

15.Obrigatoriedade de boas condições de trabalho e conforto nas escolas. Abaixo de certas temperaturas ou acima de certas temperaturas, ou em condições insalubres ou de falta de higiene, as aulas deviam ser suspensas ou mesmo, nos casos mais graves, a escola definitivamente encerrada.

Estes são só alguns exemplos avulsos de coisas que seria possível fazer. Mas repito; nada disto fará grande diferença sem uma Ordem dos Professores e sem o desmantelamento da burocracia administrativa que sufoca o ensino. O Ministério da Educação é parte do problema, e dele nunca virá a solução.

*E não só das nossas, muitos outros países sofrem do mesmo mal.A Áustria, a Suíça e a Alemanha parecem relativamente imunes, provavelmente porque nos seus sistemas políticos não há Ministérios da Educação nem entidades equivalentes a nível nacional.

**Que tal se tivéssemos em cada autarquia um Provedor das Escolas eleito por sufrágio universal?
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Medidas e Metas para a Educação
Margarida Pires 09/06/06 00:06
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ruis 13/06/06 23:06
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Quiron 17/06/06 21:06
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map 22/06/06 09:06
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Margarida Pires 22/06/06 22:06
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movalente 05/07/06 23:07
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Miguel Costa 23/10/06 10:10
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JPFerreira 29/11/06 19:11
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abelarez 18/06/06 13:06
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ruis 20/06/06 00:06
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ikhm0001 25/06/06 22:06
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Marcelo Teixeira 10/10/06 21:10
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sequeira 03/01/07 00:01
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Naifer 17/10/06 20:10
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ASilva 17/10/06 22:10
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James 21/10/06 21:10
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rutra 27/10/06 18:10
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Quiron 28/10/06 12:10
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Manuel Ferreira 14/11/06 15:11
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Miguel L. M. 25/11/06 18:11
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Maria Paula 17/12/06 20:12
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sequeira 09/01/07 21:01
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B_L 11/12/06 18:12
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Precioso 12/12/06 22:12
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sequeira 28/12/06 21:12
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isabelazinhais 21/01/07 19:01