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Educação e Ética - 25/08/06 11:08 Até perfazer nove anos de escolaridade, todas as crianças e adolescentes são obrigados a frequentar a escola. O conceito de obrigatoriedade aqui corresponde de facto ao de um direito inalienável: as crianças e adolescentes têm o direito de frequentar a escola, mas não o de optar por abdicar desse direito.
Admite-se com frequência que o usufruto desse direito é uma vantagem para os alunos. Com base nesta crença, compreende-se que não possam abdicar desse direito.
Todavia, o debate sobre as vantagens da obrigatoriedade escolar para a sociedade raramente é associado ao debate sobre a qualidade das escolas.Normalmente, ele aparece associado às questões da economia, da produtividade, etc. E todavia, se na nossa sociedade não prevalecesse ainda a ideia de que a obrigatoriedade da frequência escolar é uma vantagem para a comunidade, já quase todas as escolas se teriam transformado em repartições das finanças.
O cumprimento, por parte das nossas crianças, do serviço escolar obrigatório a favor da sociedade não pode constituir-se num castigo irremediável. À Escola não lhe basta defender-se dizendo que o que faz é bom porque é para o bem das crianças. É indispensável que esse argumento seja verdadeiro. Não sendo, os alunos têm todo o direito de acusar a escola de falta de ética.
Por uma espécie de falta de imaginação e comodismo, foi pedido à escola que fizesse o que entendesse, que, desde que fosse possível, através da sua acção, poupar tempo na selecção dos mais aptos, tudo estaria bem. Durante muito tempo, a escola é o espaço privilegiado para definir a constituição da selecção nacional.
A escola vive enfeudada por esta exigência social. E agora que os processos de selecção dos mais aptos já não podem continuar a ser como eram dantes, porque as coisas mudam, diz-se que a escola está em crise. Bem dito.
A crise da escola resulta de ela deixar de ser um espaço de formação, para ser um espaço de selecção. Esta opção corresponde, quaisquer que sejam as decisões políticas em contrário, ao nível mais baixo possível de autonomia das escolas. Continuar por este caminho é cair no precipício.
Vejamos as coisas de uma forma concreta:
Os professores, em cada ano, seleccionam os melhores e retêm os piores alunos. Ao fim de três, quatro anos, cada aluno ainda vai prestar provas num exame nacional de selecção, não vá tecê-las o diabo e os professores andarem a brincar com isto. Mas os alunos retidos não têm qualquer hipótese de aceder ao exame nacional, no mesmo período de tempo, para demonstrar que foram mal retidos. O sistema só desconfia dos que tiveram sucesso...
Ora, acontece que não faz sentido, nem é ético que a selecção, por esta via, determine completamente a qualidade da formação. Do ponto de vista técnico, a circularidade deste processo torna-o uma fraude.
Do mesmo modo, não tem qualquer sentido a existência de dois degraus selectivos (o dos professores e o dos exames nacionais). E não me venham com a história da aferição do sistema: a aferição é uma verificação; dela resultam ou devem resultar medidas correctoras do sistema; mas quando a aferição e as medidas são a mesma coisa, seguramente não são nenhuma delas com qualidade, isto é, nem a aferição é aferição, nem a medida correctora é uma medida. Em resumo, é uma outra coisa: selecção, pura e simples.
Por mim, reservaria à escola o espaço formativo: os professores só tinham de ensinar. A selecção, então, podia ser feita através de exames nacionais. A escola seria um simples executante dessa selecção externa.
Com efeito, ninguém consegue demonstrar a vantagem de reter alunos anualmente. Porque não mês a mês? Porque não de três em três anos?
Do meu ponto de vista, a decisão selectiva, a ter de existir, devia ser sempre de responsabilidade externa à escola. À Escola compete educar, formar, ensinar. E já não é pouco. Competindo-lhe seleccionar, fica-lhe pouco tempo para o resto.
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Re:Educação e Ética - 08/09/06 09:09 Não vou exactamente responder, vou antes reflectir sobre o mesmo assunto.
Sem dúvida, devemos reconhecer o alargamento da escolaridade obrigatória uma mais valia para todos as pessoas, mas não mais a vejo mais assim quando essa oportunidade (um direito e, acho, um dever de aceder a ela para qualquer cidadão) se transforma no que me parece está transformado: um processo de falsear qualificações, de promover resultados (apetecíveis)para as estatísticas, de priveligiar comportamentos desonestos (por parte de alunos e profissionais de ensino)....
Concordo com a sua intervenção no que respeita ao facto de se permitir validar casos de sucesso, com a realização de exames, e não de permitir aos alunos com insucesso de, pela mesma via, validar o que valem ou não, e se, de facto, o seu assumido insucesso corresponde ao não domínio do que aquele exame exigia. Eu penso que todos os alunos têm que ter a oportunidade de querer validar em exame os seus resultados; para o bem e para o mal. Isto quer dizer que todos os alunos têm que fazer exame, mesmo os reprovados (e nestes valeria a classificação de exame para efeitos de conclusão ou não da disciplina, com consequente ou não correspondência à conclusão de determinado ciclo de estudos.Todos os resultados têm que ser validados em exame e não só os de sucesso, concordo.
Mas agora há outra questão, a dos alunos não terem a possibilidade de não frequentarem a escolaridade obrigatória. Penso que a frequência deve ser obrigatória, o que penso é que não tem que estar vinculada a um diplomna de conclusão de ciclo. Esse diploma só deverá ser concedido aos que validem os seus resultados em exame e tenham sucesso (correspondente à passagem para o ciclo de estudos seguinte). Em qualquer outro caso entendo que os alunos deveriam (caso não tenham sucesso) ter direito a um diploma de frequência da escolaridade obrigatória. A não ser assim, vamos ter alunos na escola com idade para além da da escolaridade obrigatória a aguardar uma oportunidade do sistema para que o considere um aluno bem sucedido! Falo nos casos que todos conhecemos de querer passar todos os alunos à força, à custa de sucessivos planos de recuperação (sobre os quais já me pronunciei neste fórum) e que sabemos nunca irão poder validar esse (falso) sucesso num exame nacional (a maioria, pelo menos, pois foi tratado diferentemente ao longo do ciclo e, de repente, no exame é tratado como todos os outros). Esse aluno, se já está na idade, se ultrapassou o período de escolaridade obrigatória tem, a meu ver, direito a um diploma de frequência da mesma. Terá sempre a possibilidade que o sistema permite de ser incluido em outros sistemas de formação/cursos, já não contemplados pela escolaridade obrigatória.
Goreti
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