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Aprender mais e melhor - 22/05/06 12:05 Como fazer os alunos aprender mais e melhor?
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Mudanças curriculares - 20/06/06 15:06 Na esperança de que o que digo possa ser um contributo, porventura pequeno, mas que pretendo seja útil, para ver o que está mal e torná-lo em melhor, passo a dar a minha opinião que não é propriamente a de uma leiga ou de uma profissional inexperiente.
Com “estes dois que a terra há-de comer” ouvi de um membro, ao mais alto nível, da então equipa do Ministério da Educação mentora e acérrima defensora desta Reforma do Ensino que entrou em vigor há 3 anos, o lamentável argumento: “Sim à Reforma. É preciso mudar os programas. Isto está mal; qualquer coisa que venha a seguir é melhor que isto”. Lamentável não que o tenha ouvido, mas que alguém o tenha proferido. Sobretudo vindo de pessoa detentora de formação superior, com desenvolvimento intelectual acima da média e empossada de elevadas responsabilidades. Esperar-se-ia que soubesse ver a irracionalidade do silogismo e estranha-se que não tenha admitido, que o caminho deveria ou poderia ser “Isto está mal, há qualquer coisa que precisa de ser mudada; o quê? Tem que haver cuidado para que não se mude para pior ainda”. Mudou-se o mais fácil de mudar, certamente a componente que não era a pior, e foi de facto para pior. Talvez isto seja afinal também um reflexo do que está de facto mal na Educação e que conviria mudar, nas pessoas e nas atitudes. Com o mesmo programa, diferentes professores, com alunos diferentes, em diferentes circunstâncias fazem e sempre fizeram coisas diferentes e atingiram metas diferentes. Aliás nem houve nem há filosofia de reforma; foi mudar por mudar, sem coerência. Se mais não houvesse, bastaria olhar para os programas de Física e de Química do 12º ano; as filosofias são completamente diferentes; não sei qual delas traduzirá , se é que alguma traduz, a pretensa filosofia de reforma.
Além dos textos dos programas propriamente ditos (sobre os quais escrevi e enviei comentários para o ME), há as apresentações públicas a que tenho assistido feitas por membros da Equipa de Programas e os ecos que me chegam das acções de formação que os mesmos têm conduzido. Conhecidas as minhas posições, numa das primeiras pediram-me “que não dissesse mal para não desmoralizar os professores que já estão bastante desmoralizados”. Outro silogismo distorcido. Se calhar os professores estão cheios de razão em estar desmoralizados e camuflar e prolongar a situação é aumentar os estragos. Não lhes dar ouvidos, é pior que desprezar, é lutar contra a opinião de quem deveria ser considerado como interlocutor válido do processo e não como inimigo. Pretender convencê-los que aquele programa de Química é a almejada resposta para o sucesso à disciplina é enganá-los a eles e à Sociedade. Como é que os professores se hão-de sentir quando, entre outras coisas, além do programa, há quatro livros de Química no mercado, com conteúdos, abordagens e aprofundamentos completamente diferentes. Aliás um deles é, como é estranhamente vulgar no sistema nacional, de alguns dos membros da Equipa de Programas, o que, só por si acho mal. Supostamente será esse o que melhor traduz os conteúdos, as abordagens e os níveis de desenvolvimento que a Reforma comporta consigo. Acresce à minha perplexidade o facto de que esse livro, seja só de alguns dos autores; e os outros não se queixariam da falta de direitos de autor? Só percebo que os outros o permitam se não tiverem contribuído para a componente do conteúdo do Programa que está no livro comercializado. E aí já dá para perceber por que é que nunca vi um dado autor do Programa, ao fazer apresentações públicas em sua defesa, das quais quase só me lembro da ideia dominante de que “é preciso mudar o velho pelo novo” transmitir conceitos ou ideias de Química, excepto numa única situação em que demagogicamente denegria a própria Química com uma pergunta “Quantas vezes é que a uma pessoa lhe é colocada a seguinte questão Acerte a seguinte equação…?”, logo seguida da resposta “Uma única vez, quando é feita pelo Professor de Ciências Físico-Químicas…”. Tudo tem uma explicação; deve ser por isto que os meus colegas se queixam que os meninos quando chegam à Universidade não sabem acertar equações, particularmente as redox, o que dificulta a par e passo, designadamente, a progressão nos estudos de Bioquímica.
Associações de ideias fazem-me lembrar uma antiga estagiária, candidata a professora, a quem o Estágio não estava a correr nada bem, digamos que estava mesmo muito mal, tendo acabado por reprovar. Uma vez colocou-me a pergunta que eu própria estava farta de me colocar a mim própria “Qual é que a Professora acha que é a falha que está na base das minhas dificuldades, é de natureza científica ou pedagógica?”. Respondi que não era fácil dar uma resposta definitiva, mas de natureza científica era de certeza e isso teria levado a que os alunos a desrespeitassem.
Um dos argumentos que frequentemente vem à tona nas discussões é o de que a culpa estará nas Ciências de Educação (o Eduqês). Se bem que pode ser complexo articular a formação dos profissionais de ensino, entre a componente da ciência-base que são supostos vir a ensinar e as Ciências de Educação propriamente ditas e daí possam resultar riscos, é inegável que as Ciências da Educação, autonomizadas há mais de três décadas na estrutura da formação dos professores são essenciais para a formação equilibrada de docentes. Mas como é verdade “que isto está mau”, ou que nunca terá estado tão mau, é portanto verdade que as Ciências de Educação, se não são a causa também não foram ou estão a ser a solução do problema.
A resolução do problema passa por criar verdadeiros hábitos de trabalho (voluntariamente à força, como dizia o querido Raul Solnado na famosa rábula do Bombeiro Voluntário) integrados numa estrutura escolar, familiar e social que o proporcione e fomente, consentânea com as capacidades de progressão na aprendizagem e as fases de desenvolvimento intelectual das crianças, inerentes a cada idade, que especialistas como os Psicólogos, devem saber quais são. Penso no exemplo que vi de uma família de imigrantes de leste, cujos dois filhos, na altura de 9 e de 11 anos vieram viver com os Pais para Portugal; quando começaram a frequentar a escola portuguesa comentavam precisamente que aqui se trabalhava muito pouco. Não será difícil imaginar que estes miúdos, que não falavam português, depressa se tornaram os melhores alunos das respectivas classes e passados poucos anos, os melhores das respectivas escolas. Penso também no que está na moda actualmente na Alemanha (com situação não muito mais famosa que a nossa): o método japonês Kumon (Toru Kumon, professor de Matemática, criou, em 1958, material didático auto-instrutivo que serve de base a estudo individualizado) para o ensino da Matemática ( Missão Kumon: Descobrir o potencial de cada indivíduo, desenvolvendo-lhes as habilidades ao máximo limite, formando assim pessoas responsáveis e mentalmente sãs que contribuam para a comunidade mundial). O método Kumon consiste num trabalho intensivo e sistemático, em que os miúdos, convenientemente enquadrados, têm que resolver autênticas “resmas” (na verdadeira acepção da palavra) de folhas de exercícios num determinado tempo limite. Parte em sala de aula (uma a duas horas por semana), parte (uma grande parte) em casa (todos os dias, muitas folhas). Para quem se lembra, é assim como o método Palma Fernandes, só que com metas de número de exercícios e de tempo recorde para a sua resolução. A progressão na Matemática contribuirá por certo quase que automaticamente para tornar os miúdos mais exigentes consigo próprios também nas outras disciplinas.
Sempre disse aos meus alunos que saber fazer, não é saber dizer como é que se faz, é fazer e chegar à resposta certa num determinado espaço de tempo. E agora o tempo urge. Termino com a mesma preocupação que ouvi exprimir ao Presidente Jorge Sampaio quando visitou uma escola de miúdos finlandeses de oito anos: ”Estes miúdos já vão ser sempre homens de desenvolvimento muito superior aos nossos actuais miúdos de oito anos. Cabe-nos, como hoje outro presidente da República Portuguesa, o actual, Professor Aníbal Cavaco Silva, dizia, esforçarmo-nos por ultrapassar este desafio do qual depende a nossa sobrevivência. Não somos geneticamente inferiores, logo temos que ser capazes, individualmente e como nação.

10 de Junho de 2006
Maria Filomena Camões (Prof. Univ. Química)
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