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Reflectindo sobre a Educação! - 31/10/06 18:10 A prática docente, na conjuntura educativa actual e em qualquer domínio disciplinar e curricular, pressupõe uma postura de permanente reflexão por parte de quem pretende desempenhar uma função, cujo conteúdo funcional apresenta continuamente uma dinâmica mutacional sob vários aspectos. Efectivamente, no momento presente, reflectir sobre o papel do professor, implica não nos cingirmos únicamente ao restrito teor pedagógico da função docente. O professor não deverá ser encarado como uma ilha, no imenso mar do sistema educativo, mas sim como um elemento basilar na edificação de uma Educação plena e integral que se deseja fomentar. Terá de ser tido em conta, numa perspectiva de pertença e integração num vasto e complexo sistema de interacção de variados e muitas vezes antagónicos interesses. Assim, a reflexão que me proponho efectuar não pode menosprezar variáveis que se correlacionam directamente com a acção docente, nomeadamente, a reforma curricular e a sua coexistência com a institucionalização da obrigatoriedade da frequência escolar. São dois aspectos que na minha opinião determinam e condicionam de forma contundente a conduta dos professores, já que têm repercussões na atitude e postura que os alunos evidenciam perante a Escola. Não podemos ignorar, que a função de professor só faz sentido enquanto instrumento na formação do aluno. São as motivações, ambições e desejos dos alunos que devem nortear toda e qualquer reflexão que se faça sobre o papel dos restantes elementos pertencentes ao sistema educativo, sob pena, de não o fazendo, estarmos a enviesar a construção de um caminho para uma Educação digna desse nome.
O Homem enquanto ser eminentemente social só sobrevive e desenvolve integrado numa sociedade. As sociedades humanas foram assim estruturadas ao longo do tempo de modo a proporcionarem a satisfação das necessidades das comunidades que as sustentavam e alicerçavam. Cada sociedade estruturou-se de forma a adequar-se às especificidades culturais, sociais e económicas dos seus elementos constituintes.
Nesta estruturação, é inquestionável a importância do papel que a Educação assume enquanto veículo privilegiado de inculcação de regras e valores sociais, visando a formação de cidadãos que com as suas competências, irão e deverão fazer uso delas em benefício do desenvolvimento da sociedade em que se inserem.
Neste sentido, a Educação deve ser uma preocupação permanente de todos aqueles que madura e responsavelmente pugnam pela construção de uma sociedade mais justa, solidária e democrática, isto é, humanamente desenvolvida.
Reflectir sobre a Educação vigente torna-se mais premente numa altura em que muitas vozes a ela se referem de modo muito depreciativo. Problemas como a indisciplina dos alunos e a perda de autoridade dos professores são realidades que infelizmente não podemos nem devemos escamotear sob pena de estarmos a hipotecar irreversivelmente o nosso futuro e destino colectivos.
O Estado, com uma intenção cuja intríseca bondade não podemos questionar, instituiu a escolaridade obrigatória até ao 9º ano. Pretendia com esta medida, dotar a plenitude dos cidadãos nacionais com um leque mínimo de competências e conhecimentos que lhes permitissem crescer, adaptar-se e desenvolverem a sociedade que integram.
No entanto, a realidade evidencia com toda a clareza, que a eficácia desta medida fica muito aquém do minimamente desejável. Por via desta “obrigatoriedade” legal, os professores e muitos alunos com motivação e vontade de aprender são presentemente confrontados com a presença “obrigatória” de indivíduos cujo principal intento é nitidamente boicotar a acção pedagógica dos docentes. Mais grave ainda, é que é o próprio sistema educativo a preconizar que a esses elementos devem ser conferidas todas as atenções, como forma de recuperá-los e torná-los cidadãos conscientes e responsáveis. No entanto, as causas que estão subjacentes a essas posturas desviantes são secundarizadas e não são atacadas e debeladas eficazmente na sua origem. E aos professores continua a exigir-se que sejam mágicos e que através de artes divinas encontrem e apliquem soluções eficazes. Esquecem-se os defensores desta tese, que ao tentarem fazê-lo, os professores estão a descurar os outros alunos que se encontram predispostos a aprenderem e evoluirem. O resultado é óbvio e desolador: os alunos problemáticos não são recuperados, porque as causas não foram anuladas e os alunos motivados não aprendem, porque os esforços dos seus professores estão mais centrados nos colegas com “necessidades educativas especiais”.
Neste sentido suscita-me algumas reservas a imposição da escolaridade obrigatória.
Admito que esta minha preocupação possa chocar a maioria dos docentes e de todos aqueles que se preocupam com a implementação de uma Educação que não marginalize ninguém e que simultaneamente propicie igualdade de oportunidades a todos os cidadãos na procura da sua realização profissional, condição indispensável para a concretização de um estado de bem-estar pessoal. No entanto, esta é perfeitamente exequível desde que alicerçada numa profunda e eficaz reforma curricular que vá de encontro às legítimas expectativas dos alunos.
A abolição da escolaridade obrigatória será, eventualmente, uma medida com frutos proveitosos, se, como referi anteriormente, for acompanhada de uma reestruturação dos currículos que torne a frequência escolar um factor de motivação para os alunos e não num fardo pesado que “obrigatoriamente” têm de carregar numa determinada fase da sua vida.
É minha convicção, que todas as reformas curriculares implementadas nas duas últimas décadas em Portugal têm visado a realização de um Ensino no qual os alunos se revejam e se constitua instrumento privilegiado para a concretização dos seus mais variados e diversos objectivos de vida. A ser assim, o carácter obrigatório da frequência escolar, seria perfeitamente desnecessário. Aliás, julgo, que num regime democrático, digno desse nome, não faz sentido obrigar quem quer que seja a frequentar ou participar em actividades para as quais não se encontra minimamente motivado ou interessado.
Quero no entanto realçar que o facto de colocar algumas objecções à escolaridade obrigatória, não invalida que reconheça o papel fundamental que a Escola assume enquanto instituição alicerçadora de qualquer Sociedade que se queira devidamente estruturada e organizada.
Com efeito, conceber uma Sociedade sem Escola ou Instituição afim, é concepção que merece a reprovação unânime de todos os intervenientes no processo de ensino e formação.
Sendo assim, o que urge reflectir é sobre o modo como se deseja desenvolver e concretizar a acção da Escola no seio da Sociedade.
Várias questões se colocam: Que papel deve ter a Escola? Quais os conhecimentos a transmitir? Quais os valores sociais a reproduzir? Quais as capacidades a desenvolver? Quais os comportamentos a incentivar e a modificar? Que métodos pedagógicos devem ser utilizados para esse fim? Que currículos devem ser adoptados?
Enfim, diversas questões que devem merecer a preocupação constante e permanente de todos aqueles que directa ou indirectamente, participam na construção de um sistema educativo que vá de encontro às necessidades sociais.
Tal preocupação, é cada vez mais premente numa Sociedade onde os desafios e as mudanças surgem continuamente a um ritmo exponencialmente alucinante, implicando este facto que todo o indivíduo, como forma de se sentir plenamente integrado nessa Sociedade terá de estar munido das “ferramentas” que lhe possibilitem superar as dificuldades e obstáculos que se lhe deparam, de forma contínua e por vezes imprevista.
Neste sentido, um dos problemas que presentemente se levanta, prende-se com o carácter pedagógico que deve ter a Escola contemporânea: Generalista ou Especialista?
Deveremos saber de tudo um pouco, ou tudo de pouco?
Efectivamente, as necessidades actuais não se compadecem com conhecimentos superficiais sobre um diverso e variado leque de assuntos. Cada vez mais a especialização surge como instrumento imprescindível a ser utilizado por cada um de nós no nosso dia a dia. Cada pessoa reúne no seu seio, um conjunto de dons e aptidões que devem ser explorados e rentabilizados no sentido de lhe proporcionar competências nos mais diversos domínios, tais como: no pessoal, no familiar, no âmbito social, no cultural, no político e no profissional.
Só assim, fará sentido toda a nossa acção individual enquanto elementos pertencentes a uma Sociedade que se quer sólida e desenvolvida. Todos nós temos uma função e missão a desempenhar na manutenção dessa Sociedade. A nossa acção individual complementa-se com a dos restantes elementos. Dessa complementariedade pode resultar um desenvolvimento mais ou menos profícuo. Quanto maior fôr essa proficiência, mais necessidades estarão a ser eficazmente satisfeitas.
Este deverá ser um dos objectivos fulcrais com que deverá se preocupar o sistema educativo ao estruturar o ensino.
Quero no entanto realçar que não se deve depreender das minhas palavras que a vertente generalista deverá ser abolida, muito pelo contrário. Esta deverá estar na base de qualquer currículo, digno desse nome.
Contudo, sou de opinião que mesmo na fase generalista do ensino, o sistema deveria possibilitar que os alunos fossem tendo noção e consciência das suas naturais aptidões e vocações. Tal poderia ser feito com um acompanhamento regular de psicólogos e especialistas afins que ao longo desta fase, iam aquilatando e detectando os reais interesses e necessidades dos discentes, no sentido de os auxiliar na escolha mais gratificante do seu futuro académico e profissional. Julgo que esta medida acarretaria algumas vantagens significativas.
Por um lado, estes psicólogos, sendo conhecedores das reais expectativas e desejos dos alunos, seriam elementos fundamentais a serem tidos em conta na elaboração dos currículos da fase especialista do ensino.
Por outro lado, os próprios alunos saberiam que o sistema de ensino, numa fase mais avançada, lhes iria possibilitar a concretização dos seus legítimos anseios. Que maior motivação poderão ter os alunos do que esta? Muito provavelmente, o facto de saberem que o sistema de ensino lhes possibilitava um futuro profissional que os realizava, determinaria que seriam eles próprios a encararem a Escola como uma Instituição essencial no seu processo de amadurecimento e não como uma fatalidade e obrigação. Estariam assim criadas as bases para os alunos sentirem a necessidade da aprendizagem, traduzida no gosto por aprender. Desta satisfação, dependerá todo o sucesso escolar, pois não há pedagogo que atinja os seus objectivos se os seus alunos não quiserem aprender. O Ensino só é pleno se ao trabalho do professor, corresponder o empenhamento do aluno, conjugados em equipa unida e articulada.
Desta dicotomia entre a vertente generalista e a vertente especialista, terá emergido a recente reforma curricular do ensino básico e secundário, reforma essa que se encontra presentemente a ser implementada na sua fase embrionária, e que tem suscitado polémica e algumas pertinentes críticas. O que se deverá ter em conta na sua implementação é o seguinte: um currículo, deverá simultaneamente ir ao encontro dos dons e aptidões que os alunos apresentam, bem como procurar facultar-lhes as disciplinas que lhes proporcionem as devidas competências para as funções que se propõem e desejam desempenhar.
Só assim, a Instituição Escola, estará a cumprir o seu papel de forma eficaz, pois estará na génese de profissionais motivados e competentes, condição essencial para a qualidade de toda e qualquer função.
Ao proceder deste modo, o Estado sem ter a necessidade de instituir a obrigatoriedade da frequência escolar, estará de forma responsável a facultar uma formação escolar abrangente, na qual todos os alunos encontrarão um currículo que os alicie. Quem não quiser, não tem a obrigação de ser sujeito a uma aprendizagem que rejeita, nem o direito de entravar e obstaculizar o esforço e empenho de docentes e discentes. Se assim for, estará o sistema educativo a contribuir para a génese e formação de cidadãos maduros, conscientes dos seus deveres e direitos, condição essencial para a estruturação de uma Sociedade digna desse nome!

Rodrigo Trancoso
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Reflectindo sobre a Educação!
rodrigotrancoso 31/10/06 18:10
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Rodrigo Trancoso 07/11/06 15:11
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Alberto Berta 09/11/06 11:11
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rodrigotrancoso 09/11/06 17:11