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Até ao 9º ano - 02/09/06 14:09 Até ao 9º ano, reflexões

Setembro está a ser recheado de notícias sobre o estado do nosso saber em Matemática, com base na amostra de alunos opositores ao exame nacional do 9º ano.

Parece-me que se fala muito e não se diz nada, e se eu não fosse professora de uma disciplina que exige cálculo, se não estivesse no terreno, e se não conhecesse nada da legislação que suporta o que deve ser o Ensino Básico, só me ocorreria uma opinião: que é que os professores estão a fazer na escola? Todos! não estou a falar só dos de Matemática.... Acredito que se o exame fosse de Física e Química os resultados seriam iguais ou piores! Sabem porquê? Não é só contas que os alunos não sabem fazer! Eles também não sabem ler, interpretar.... Mas os que não sabem e passam vão continuar sem saber!

O Ofício Circular n.º 50, da DREL, de 11 de Agosto no seu ponto 4, diz que "a retenção deve ser uma medida pedagógica de última instância..." assim, ou por outras palavras, encontramos o mesmo em muita outra legislação sobre o assunto. Penso que sempre o terá sido, e não acredito que os profissionais de ensino que algures no tempo (no meu tempo de aluna) assumiram retenção de alunos o tenham feito levianamente, sem ponderar seriamente as razões que justificavam a retenção. Era eu estagiária, há cerca de 20 anos, e já os meus orientadores me falavam em dar sempre ao aluno o benefício da dúvida, mas depois de bem ponderar todas as tentativas de o ajudar e o trabalho desenvolvido pelo aluno. Acontece que, hoje, um aluno não é retido no 5º, nem no 6º, nem no 7º, nem no 8º..... passando sempre à custa de todos e mais alguns planos de recuperação (e já pode vir assim desde o 1º ano) e, uma vez no 9º, é presenteado com um exame nacional que quer lá saber das condições em que os alunos lá chegaram, quer lá saber de cada aluno como um individuo!!!!! E para muitos alunos, o único plano de recuperação que permite a a proposta de não retenção, é um plano que contemple o nível mais baixo de exigências.... quem sabe trabalhos ao nível de 1º Ciclo (e do mais elementar!).
E sabem? Eu até sou totalmente a favor dos exames nacionais, mas não nestas condições....
Não está previsto que o aluno possa frequentar a escolaridade obrigatória e que tenha direito ao diploma de frequência do 9º ano? Então para que andamos todos a (querer) fingir que todos os alunos concluíram, com qualidade e aproveitamento, em matérias e graus de exigência que se pretendem universais? É mentira! e o resultado em exames nacionais revela isso mesmo para a maioria dos alunos (e digo para a maioria, por assumir uma margem para aqueles que sempre acham que apenas foi o azar que ditou aquele resultado, tão diferente do que teve na classificação de frequência, serão excepções!)
As propostas para o Ensino Básico apontam para um ensino diferenciado, quase um aluno um professor (não obstante a dimensão das turmas!), e depois vem um exame nacional, universal! Um professor (aqui simbolizando a equipa que elabora os exames) para todos os alunos, considerados como iguais! Adeus ao aluno como individuo, adeus ensino diferenciado, adeus planos de recuperação! É caricato, no mínimo: todos diferentes (durante um ano) e todos iguais (num só dia).

Só para rematar, e acreditando que a imagem pode não ser muito feliz. Vou regionalizar. As crianças de Monchique (pelo menos as do 1º CE escrevem "vou à da avó", querendo dizer "eu vou à casa da minha avó", e vão passando (não fosse por isso, concordo), e a professora vai sempre corrigindo, certamente, e dizendo que não podem escrever como falam. Repare-se que nem sequer existe nenhum erro ortográfico em "vou à da avó", outras análises saberão fazer os estudiosos da língua (não é assunto do meu pelouro). Também todos entendem o significado daquela expressão, no discurso oral ou no discurso escrito, portanto há comunicação, mas... Os alunos são todos diferentes, é verdade, também as regiões são todas diferentes, é verdade, então temos que diferenciar tudo! Que os planos de recuperação dos alunos de Monchique contemplem o modo como se fala na região e veremos se os resultados na escrita, pelo menos, não serão melhores! Se calhar esses planos passarão a ser desnecessários, mas os alunos vão chumbar nos pseudo exames nacionais (do 4º ano)!

O objectivo da escola é permitir um ensino personalizado e diferenciado? Então que também o seja nas formas de avaliação das aprendizagens e nos diplomas que quer atribuir na sequência das mesmas: frequência ou conclusão? E eu diria mais, que do diploma conste que o aluno foi submetido a planos de recuperação! Não é previsto na lei que vá passando assim? Então que seja assumido no documento que traduz os resultados finais. De resto, todos os alunos terão a oportunidade de ver validado o resultado num exame nacional, traduza ele ou não as suas reais sabedorias, mas, vamos acreditar, é a melhor forma de objectivar a avaliação.
... Isto vai chegar aos 10º, 11º e 12º! Quem gostará de ser atendido por um profissional de saúde que sempre foi transitando à custa de planos de recuperação? Ou de ser ensinado por professores nas mesmas condições? Só exames nacionais de qualidade não deixarão que lá cheguem!
Se os exames, para já, se apresentam como a única forma de validar mais seriamente as aprendizagens, bem hajam!

Goreti
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Re:Até ao 9º ano - 03/11/06 14:11 Até ao 9º Ano?
Implementação de Exames Nacionais nos 4º, 6º e 9º Anos. Tudo seria diferente.
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Re:Até ao 9º ano - 09/11/06 17:11 A Forista Maria Goreti levanta uma questão muito pertinente neste seu artigo: Qual a lógica subjacente ao facto de durante o ensino básico pretender-se aplicar em simultâneo duas filosofias educativas que nos seus propósitos e métodos são antagónicas?
Refiro-me à coabitação existente entre Projectos Curriculares de Turma e a realização de Exames Nacionais. Um anula o outro.
Se queremos preparar os alunos para um Exame Nacional que é uniformizador na avaliação, qual o sentido de aplicar durante o ano lectivo um projecto curricular de turma?
Se aplicamos o projecto curricular de turma, como forma de adequar o currículo às especificidades sócio-culturais da turma, como podemos depois querer que esses alunos façam um Exame que os avalia em igualdade de circunstâncias com todos os outros alunos das restantes escolas e regiões do país?
Os especialistas do ME que esclareçam a razão de ser destas duas lógicas educativas que colidem frontalmente uma com a outra!

Rodrigo Trancoso
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